Paraíba

Realidade do Porto do Capim e a resistência das mulheres são temas de análise Professora; confira

A professora universitária Raquel Azevedo, do Departamento de Comunicação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), publicou artigo no jornal A UNIÃO.


11/07/2019

Porto do Capim, em João Pessoa



A professora universitária Raquel Azevedo, do Departamento de Comunicação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), veicula nesta quinta-feira (11), página 15, do Jornal A UNIÃO, um novo artigo em sua coluna semanal, agora abordando a realidade do Porto do Capim diante da resistência de mulheres que não querem sair do lugar e como age a Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP) diante da situação.

 

Confira: 

 

Porto do Capim

 

Na última sexta-feira estive no Porto do Capim com um grupo de estudantes que cursam comigo uma disciplina chamada Jornalismo Especializado. Não foi a primeira vez em que estive lá com meus alunos e alunas. Lembro que em 2014, pude estar lá com outro grupo.

 

Passados anos entre uma visita e outra, o que nos levou até lá, foi o mesmo motivo: a resistência da comunidade diante da tentativa de sua remoção frente ao projeto de “revitalização” através efetivação do PAC Cidades Históricas e PAC SANHAUÁ Porto do Capim.

 

Nos encontramos na entrada da CBTU e seguimos caminhando rumo à comunidade ribeirinha. Grande parte nunca havia estado lá, mesmo tendo nascido na cidade de João Pessoa.

 

Para nós aquele momento significava um passo importante: promover o deslocamento de uma cultura digital, que contribui de certo modo para o isolamento físico e cultural, para buscar uma aproximação e um melhor entendimento da vida social, pois é no real que de fato existimos.

 

Ao chegar no Porto do Capim reencontrei seu Cosme, pescador, seus filhos e netos, que vivem do Rio Sanhauá. Ele resistindo para ficar, expressando numa fala angustiada as suas razões. Citava sua chegada muito jovem, a construção de sua casa e de uma vida pertencendo a esse lugar, os filhos e netos, o trabalho e a vizinhança. Depois de caminhar pelas ruas chegamos à Vila Sanhauá, cujas casas estão sendo demolidas.

 

Confesso que tive vontade de chorar ao ver reunidas as mulheres em torno de suas casas como se estivessem num front. Na verdade penso que estavam sim, no que elas mesmo denominam há anos de resistência.

 

“Somos resistência”, dizia uma delas, ao passo que trêmula, mostrava as ruínas diante das outras casas que ainda permaneciam de pé.

 

Penso que a vida no Porto do Capim não tem sido fácil diante da tensão da remoção, da desconstrução não apenas física, mas sobretudo de um lugar de pertencimento maior ao longo de décadas a fio, numa área que possui o marco de ser o início da cidade.

 

Além do mais por amargar também ao longo de décadas ou séculos muito descaso do poder público e indiferença por parcelas significativas habitantes da cidade de João Pessoa. Não precisa ser arquiteto ou urbanista para entender as carências que envolvem o espaço urbano.

 

As necessidades históricas e latentes de melhoria das condições de vida, moradia, educação e trabalho daquela população ribeirinha.

 

Mas é também desafiador, para a própria comunidade local, aceitar os projetos de “revitalização”, sem refletir sobre os mesmos, ou sem reagir aos mesmos.

 

E assim tem sido a postura de muitos moradores, dentro de uma organização coletiva e comunitária que tem pautado muitos setores para pensar o direito à cidade. Seja nas ações culturais de ocupação do Porto do Capim, no cotidiano da organização das Mulheres em Ação, seja no desenvolvimento de ações turísticas de base comunitária, ou realizando protestos em lugares da cidade, a população tem construído sua narrativa tentando explicar suas razões para ficar.

 

A resistência cotidiana da população ribeirinha do Porto do Capim sempre me faz pensar como infelizmente pouco sabemos do Plano Diretor, e de quanto precisamos avançar no entendimento do direito à cidade, num município que se reconfigura diariamente, se alarga marcado por grandes desafios como o crescimento de moradores de rua em diversas áreas, diminuição da área verde pelo desmatamento de árvores, problemas de mobilidade urbana, e poluição seja das praias, sonora e visual. Sem falar no patrimônio histórico envolto na triste realidade de se tornar ruínas.

 

É claro que nossa cidade não se resume aos seus desafios, e também faço reconhecer transformações relevantes como a melhoria do Parque Solon de Lucena, da avenida Beira Rio, das vias exclusivas para ônibus, da inclusão de mais ciclovias, a tentativa de melhorar a iluminação pública e mercados da cidade, e o saneamento básico.

 

Só que fico ainda pensando no Porto do Capim, nas mulheres que lá resistem, que querem permanecer porque é neste espaço que suas vidas fazem sentido.

 

Reflito sobre a tentativa de se constituir uma cidade criativa, que efetivamente se realiza quando incorpora, inclui e agrega a força de trabalho e a criatividade existente em diferentes espaços e atores sociais.

 

Sigo pensando ainda nesta cidade na sua relação com as águas, dos seus rios e do Oceano, belas paisagens que por vezes, e aos poucos, desaparecem asfixiadas pela poluição e descaso.



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