Justiça

Edital de eleição para conselheiros tutelares permite candidatura de pessoas que respondem a crimes; entenda


21/06/2019

Imagem meramente ilustrativa



O edital para novos conselheiros tutelares abre brecha para que candidatos que respondem crimes possam concorrer a vaga de conselheiro. É o que alerta uma especialista, conforme texto subscrito. 

De acordo com a publicação, pedófilos, por exemplo, podem concorrer a vaga até que o crime seja transitado e julgado. 

Confira:

EIS O TEXTO

O edital das eleições para o Conselho Tutelar de João Pessoa contém erros que permitem a candidatura de cidadãos que respondam a crimes de qualquer natureza.

 

Isso porque o texto confunde, inverte, o conceito de primariedade com o de idoneidade moral.

 

A exigência prevista no edital é de que os candidatos apresentem documentos para comprovar a sua primariedade, ou seja, para demonstrar que não tenham condenação criminal em caráter definitivo. A legislação sobre o tema, porém, prevê que os conselheiros tenham comprovada (documentalmente) idoneidade moral – conceito que se refere à personalidade e engloba a conduta pública e privada ilibada, a vida pregressa limpa e a ausência de qualquer espécie de envolvimento com qualquer prática imoral ou criminosa, inclusive aquelas já cumpridas ou arquivadas por prescrição.

 

Da forma como foi divulgado – desvinculando o conceito de idoneidade moral da conduta social, o edital não estabelece nenhuma barreira para a candidatura de usuários habituais de drogas e alcoólicos, embora sua conduta seja obviamente um péssimo exemplo e os inabilite do ponto de vista moral para atuar na defesa dos direitos dos incapazes. Podem concorrer até mesmo cidadãos que estejam, por exemplo, respondendo a processos por abuso infantil, assédio sexual, estupro, pornografia infantil, agressão, homicídio e sequestro.

 

O conceito de primariedade é relacionado à presunção de inocência, mas tem sua aplicação limitada apenas à esfera penal. A jurisprudência já estabelecida é de que, no âmbito da representatividade eleitoral de qualquer natureza, a presunção de inocência perde espaço, pois o se exige é a verificação da idoneidade moral, para garantir “a moralidade (…) considerada a vida pregressa do candidato”, conforme previsto no artigo 14 da Constituição Federal.

 

Tanto é que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a validade da chamada Lei da Ficha Limpa, estabelecendo que a existência de processos em curso basta para a formulação de um juízo de reprovabilidade moral em relação a qualquer candidato. Em outras palavras, é perfeitamente possível que alguém não tenha sido condenado em definitivo (com o chamado trânsito em julgado), mas mesmo assim não reúna as condições morais necessárias para o exercício de atividades de interesse público.

 

Papel do conselheiro tutelar

É válido lembrar que a função de conselheiro tutelar é zelar pelas crianças e adolescentes – no que se inclui sua proteção da violência, cujos direitos são assegurados pela Constituição Federal, que trata a vida dos infanto-juvenis como “prioridade absoluta”.

 

Embora o Estatuto da Criança e do Adolescente, dispositivo criado para garantir o cumprimento das leis constitucionais, exija a comprovação de reconhecida idoneidade moral tanto para a candidatura para o exercício da função de conselheiro (art. 135), mesmo requisito exigido pela Lei Municipal (nº 11.407/2008) que rege o processo eleitoral, o edital elaborado violou tais legislações.
As falhas do edital tornam-se ainda mais dramáticas quando se leva em conta que a eleição servirá para a escolha dos conselheiros tutelares de uma cidade já abalada pelo “Caso GEO”.

 

Está claro que é necessário se maximizar o rigor na comprovação para a escolha dos que vão atuar com crianças e adolescentes.



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